27/05/2010

Cortes

Mota Amaral concorda com a redução de número de deputados, o que, aliás, é objecto de uma petição que conta com mais de 20 mil assinaturas e que deverá ser discutida no Parlamento.

Quando se fazem cortes existem sempre umas coutadas, pelo que se opta, geralmente, por cortes conjunturais em vez de perseguir objectivos estruturais.

Num País desta dimensão justificam-se 308 municípios? E mais de 4 mil freguesias? Não é essa uma questão a analisar de forma séria? Para que é que servem exactamente as freguesias na maioria destes municípios? Sem o financiamento dos municípios têm alguma capacidade de subsistir? E já alguém analisou, friamente, o número e finalidades das associações de municípios, que proliferam num frenesim, em muitos casos não respeitando minimamente o espírito da lei? E as empresas municipais, intermunicipais e restantes entidades do sector empresarial local? O Tribunal de Contas já se dedicou a esmiuçar as contas destas? A fiscalizar? A legislação mudou em 2006. Produziu consequências práticas na criação e gestão destas entidades?

Há sempre um caminho mais fácil, mais cómodo e que produz efeitos mais palpáveis no curto prazo. Mas a verdade é que o regabofe continua. Tapa-se a cratera com a areia de um buraco. Só que passados uns anos, a cratera regenerou-se e clama.

(des)Protecção Social

Depois de dizer o que diz aqui, Helena André acrescenta que “não vai haver nenhuma redução da protecção social”, o que é, no mínimo, um gozo.

Estes senhores estão convencidos que somos tolos.

25/05/2010

Dois pesos, duas medidas

É por estas e por outras que às vezes é difícil travar a contestação social e a indignação geral, quando se pedem sacrifícios às famílias e, sem qualquer pudor, se aumenta a despesa em regalias.

20/05/2010

Mentir

Mantém-se a dúvida: Sócrates mentiu ou não no Parlamento no caso PT/TVI? Passos Coelho diz que se o PM mentiu não tem condições para continuar e, assim, é de ponderar a apresentação de uma moção de censura.

O Governo não mentiu sobre o défice em 2009? Sobre o estado das contas públicas? Não ignorou e ocultou os avisos da DGCI sobre a quebra da receita fiscal? Não mentiu sobre a situação real do País, cumprindo o calendário conveniente ao PS?

Existem, no entender de Passos Coelho, mentiras de primeira e de segunda?

Uma crise política, sobretudo num cenário de eleições antecipadas em 2010, é grave. E não convém, nem ao PSD, nem a Cavaco, nem ao PS. A iniciativa comunista da moção de censura é irresponsável, porque em teoria poderia despoletar a crise política. Mas fica a dúvida sobre a convicção de Passos Coelho nesta declaração.

19/05/2010

Fechado para balanço

Raios partam a crise. Não se vive descansado neste País. Todos os dias um sobressalto, faits-divers políticos, embrulhadas, trapalhadas, comissões e moções, votações, comunicações, entrevistas, declarações. Não há paz. Nem olhar para eles, ouvir vozes estridentes, numa algazarra que nos vai tornando surdos. Exaustos. Exasperados. Digam o que disserem, soa sempre ao mesmo. Nada. Sumo da laranja ressequida, aquele paladar entre o amargo e o seco. Raios os partam a todos. O défice, o TGV, a moção de censura, a PT e a TVI, as pontes, as barragens. Os fatos e as gravatas, os sapatos, os botões de punho, a base e o blush, as caras amassadas, as olheiras.

Que se ponha a placa: “Fechado para balanço”.
Quando se voltar à vida, avisem.

17/05/2010

A arte do silêncio

Cavaco Silva fez mais uma comunicação que podia ter evitado. A ausência de consenso e as consequentes clivagens de que fala teriam menos impacto se o próprio se expressasse sem a solenidade de uma comunicação ao País.

É verdade que não é tema que justifique desviar a atenção daquilo que realmente interessa. Mas o próprio contribuiu para isso com esta mensagem.

O problema de Cavaco é ideológico, o que é compreensível e legítimo. Mas o PR deve ter consciência da sua posição no xadrez do sistema político e dizer que vetava mas não veta porque é inútil é, no mínimo, patético. Misturar aqui no meio a crise e o desemprego e etc e tal chega a ser jocoso. Porque é como mandar uma séria de recados sobre uma série de coisas e assumir: “Pronto, estou realmente aborrecido com isto, mas também já não posso fazer nada. Não vale a pena. Os gajos levam sempre a deles avante”.

Há três momentos do discurso que são de mau gosto, provocatórios e que não dignificam a figura do PR:
1. A alusão ao casamento como união entre homem e mulher. Ok, o tal parecer do Prof. Freitas do Amaral que sustenta a afirmação. Mas aqui não se trata de uma formalidade jurídica, é uma questão ideológica e, eventualmente, religiosa, às quais o PR deveria ser alheio;

2. A contabilização dos países que fizeram assim ou assado. O PR não tem nenhuma necessidade de fazer contas de merceeiro para sustentar a sua opinião, a menos que se sinta desconfortável no que defende;

3. Os dois últimos parágrafos da intervenção. Primeiro, a alusão à mensagem de Ano Novo, como confirmação da profecia; depois uma frase enigmática, quase ameaçadora. Por último, esta frase: “Há momentos na vida de um País em que a ética da responsabilidade tem de ser colocada acima das convicções pessoais de cada um “. Certíssimo, por isso mesmo esta mensagem era desnecessária.

E mais. Cavaco fez esta comunicação ao País, soleníssima, com dois propósitos: primeiro, justificar-se ao seu eleitorado, perto de entrar em pré-campanha, o que lhe fica mal; segundo, aproveitou para mandar outros recados, misturar as coisas, e mostrar que existe agravo, azedume ou descontentamento com a maioria parlamentar e/ou com o Governo, o que também lhe fica mal. Há atitudes que se admitem a um primeiro-ministro, mas das quais o PR se deve defender.

El tangero

Está tudo dito. Afinal o homem é um tangero.

Achas que sabes dançar?

Crises

O Público de ontem trazia um artigo interessante que compara a crise de 2010 com a de 1983/84. E sublinha uma realidade que os decisores estão a tentar ignorar: de lá até aqui não se atacou o problema na sua génese. E, em 2010, vamos tentar remendar uma situação, convictos de que a probabilidade de voltarmos a passar por isto se encontra num horizonte inferior a 20 anos.

No outro dia, uma senhora entrevistada por um canal de televisão por causa do aumento de impostos, aí dos seus 70 anos, dizia que tem 3 filhos e todos foram criados em crise. Ora bem.

A arte de falar

Cavaco Silva dirige-se esta noite ao País. O tema é o casamento homossexual, subsistindo dúvidas sobre a intenção do Presidente – vetar ou promulgar? Sempre que Cavaco se dirige ao País há suspense. Sobretudo depois da famigerada comunicação das escutas.
O tema do casamento entre pessoas do mesmo sexo, após a partida do Papa, é, ainda, mais delicado. E, neste momento, tudo o que não se deseja é a criação de um facto político que contribua para a instabilidade reinante. Ou Cavaco tem alguma coisa realmente importante a dizer ou esta intervenção, além de despropositada, poderá ter um preço demasiado alto, já que os portugueses se vêm mergulhados numa onde de indignação fruto de medidas impopulares ainda em fase de anúncio.

Hoje também se assinala o dia mundial contra a homofobia. Em caso de veto, o timing é o pior. Em caso de promulgação, Cavaco quer o quê? Justificar-se ao seu eleitorado natural? E era preciso fazê-lo nestes termos?

14/05/2010

Austeridade

As medidas de austeridade apresentadas pelo Governo não surpreendem. Eram expectáveis, sendo que, para já, não houve uma redução de salários, como em Espanha.

De qualquer modo, este conjunto de medidas peca pelo mesmo mal de sempre. O objectivo é um e imediato: reduzir o défice e controlar as contas públicas. Contudo, o aumento de impostos, sobretudo o IVA e impostos sobre os salários, colocam em risco o crescimento económico. Nesse sentido, era expectável que, a par de medidas de austeridade, fosse apresentado um pacote de medidas de incentivo à recuperação económica, que deixasse vislumbrar a esperança da recuperação do emprego. Podiam ser medidas artificiais, baseadas nos financiamentos disponíveis do QREN, mas incutissem confiança – o que é diferente de iludir.

Dos discursos dos últimos dias, o mais inteligente e com maior sentido de Estado foi o de Passos Coelho, na conferência de imprensa de ontem. Além do discurso estar brilhantemente estruturado, foi proferido de forma quase perfeita: serena e pausadamente, voz grave e sem precipitações na fase de perguntas dos jornalistas. Passos é o verso de Sócrates, cuja voz é ou se tornou irritante, que acentua de forma aguda os discursos e ganha uma energia raivosa a meio. Ao fim destes anos, a serenidade é uma vantagem.

11/05/2010

O Papa é o Papa

Revejo-me questões. A visita do Papa é cara, representa um gasto supérfluo numa altura em que se pedem sacrifícios aos portugueses, entre os quais a subtracção de direitos. A máxima parece ser: “grão a grão enche a galinha o papo”. Se, não sendo muito representativos no todo orçamental, os subsídios de Natal devem ser sacrificados em nome da estabilização financeira, 37 milhões por cada dia da visita do Papa também são uma enormidade.

Mais: sinto um arrepio nas entranhas por causa da discriminação positiva que o Estado faz em relação à Igreja Católica. A pergunta que o presidente da CIP faz no último parágrafo desta notícia saiu-me boca fora assim que soube da ponte. Os meus colegas de trabalho indignaram-se com a minha ousadia. O Papa é o Papa. Mais nada.

10/05/2010

Corte, Costura e Remendos

I. Corte
Esta crise está a ser combatida por via do corte. Mas o caminho fica a meio se após o corte não houver costura. No fim, o trapo fica esfrangalhado e é nada.

O problema português não é conjuntural. A crise internacional só expôs uma fractura escondida. O nosso problema é estrutural, vem de longe, é da responsabilidade de todos os Governos dos últimos 30 anos e chama-se Economia.

Certo, há que cortar. E há que cortar mais e em muita coisa. Tenho dúvidas em relação às prioridades do corte, uma vez que vejo pouco combate ao desperdício e os funcionários públicos são sempre as primeiras vítimas. Fala-se muito da pouca produtividade dos funcionários, da fraca eficiência dos serviços, mas ignora-se, em geral, a realidade concreta das coisas. E que grande parte dessa ineficiência poderia ser ultrapassada com medidas simples, na maior parte amigas da transparência, mas muitas vezes ameaçadoras para decisores e políticos.

II. Costura
O problema é conjuntural, dizia acima. E chama-se Economia, acrescentava. Pois bem: Portugal tem uma estrutura económica débil, arcaica e, muitas vezes, saloia. Podemos regularizar o défice, mas se não refundarmos a nossa capacidade económica, em poucos anos estamos na mesma. Foi o que aconteceu até aqui, vivemos de crise em crise, justamente, porque não temos economia. Desperdiçámos, ao longo dos últimos anos, onde encontrámos períodos de enorme potencial, a oportunidade de criar um País economicamente mais sólido. Para isso bastava ter aplicado, correcta e seriamente, como fizeram outros países europeus, os milhares de milhões de fundos comunitários que por aí passaram.

A Europa faz bons diagnósticos, planeia bem, tem os assuntos bem documentados. Leiam-se os documentos estratégicos do QREN (nacional e dos outros países), mas a liberdade de cada um ainda é demasiado grande. E o chico-espertismo lusitano tem ignorado sucessivamente as estratégias desenhadas. A nossa agricultura é inexistente e vive dos subsídios; as pescas foram delapidadas e vivem dos subsídios – ok!, são dois sectores sensíveis. As empresas vivem das linhas de financiamento. Não investem em projectos por acreditarem ou precisarem deles, investem porque existem milhões de euros para isto ou para aquilo. A indústria vai-se aliando às universidades, e bem, mas sem investir um tostão: financiamento para isto, financiamento para aquilo. Não há empreendedorismo. O risco é básico no conceito de empresa. Como os empresários portugueses não arriscam o mínimo, creio que não temos empresas.

III. Remendos
O que me espanta, por estes dias em que se apregoam soluções milagrosas, é que todas as medidas anunciadas são imediatas: reduzir o défice. Certíssimo, é imperioso reduzir. Sim, há que fazer cortes e sacrifícios. E depois? A seguir? Continuamos a ficar mais pobres, até nos roubarem os ossos do prato? Por esses concelhos fora, um pouco por todo o País à excepção das grandes áreas metropolitanas, o número de empregos gerados pelo sector dos serviços é enorme. Grande parte deles no sector público. Porquê? Porque não há economia, não há empresas, não há iniciativa privada. A que existe é frágil, gerida sem profissionalismo, muitas vezes encostada ao Estado, ao pequeno caciquismo local e a viver à sombra de interesses ou a fazer-lhes uma confortável sombra. Outra é de capital intensivo, que é bom, gera emprego, contribui para as exportações, mas é efémero. Fecha-se o ciclo e ficamos com as calças na mão – é o que acontece na indústria automóvel, na petroquímica, nos recursos naturais endógenos.

Ao Estado não caberá fazer a Economia. Mas deve-lhe criar condições, estimulá-la e imprimir rigor. Ser exigente. Quando se atribui um subsídio tem de ser exigir que ele se converta numa mais-valia para a sociedade – isto também é do conceito empresa, criar mais-valias sociais. Imprimir políticas sérias de responsabilidade social. Se a atribuição de financiamentos não é fiscalizada, se a burla é impune, chega-se a este ponto. E alguns investimentos públicos são indispensáveis para criar condições, sobretudo para as exportações. Sem eles nem o capital intensivo nos vale - por isso Sines ainda é o que é, aguarda há décadas por infra-estruturas básicas de mobilidade, por exemplo.

O que custa ao aceitar estes sacrifícios é que parece que os vamos fazer cegamente. Para equilibrar as contas. Só. Depois, logo se vê. Pode ser que vivamos meia dúzia de anos folgados e, a seguir, aperta-se. Mas o Estado de Bem-Estar tem sempre exigências novas. E das duas umas: ou abdicamos, de vez, do bem-estar, ou instala-se a lei da selva.

Acredito que vai ser difícil conter a contestação social, as manifestações e até, quem sabe, evitar cenários de violência nas ruas. As pessoas estão cansadas e duvido que ainda acreditem numa promessa longínqua, tantas vezes repetida. Há menos de um mês, o primeiro-ministro garantia, no Parlamento, que não havia lugar a subida de impostos.

(Mais) Sentido de Estado

Alberto João Jardim defende o fim de despesas inúteis, extinguindo organismos como a Entidade Reguladora da Comunicação, o Tribunal Constitucional e a Comissão Nacional de Eleições.

As despesas de funcionamento dos diversos ministérios em consultorias (existem escritórios de advogados que vivem do expediente de fazer estudos para a elaboração das leis, depois de estudos sobre a interpretação destas e depois andam nos tribunais a contestá-las em providências cautelares), bem como as inúmeras nomeações para outros tantos organismos, entre os quais empresas públicas, bem como as regalias associadas a determinados lugares, é que não são para mexer. A racionalização da despesa, num concreto combate ao desperdício, não é uma prioridade - ideia dos Simplex é óptima mas não faz um combate ao desperdício nem promove a eficiência. Não vale a pena mexer nos boys e girls que proliferam por aí.

Mais valia acrescentar a esta lista o Tribunal de Contas, a Inspecção-geral de Finanças e o Supremo Tribunal de Justiça, etc.

Jangada de pedra

Com a iniciativa de receber ex-ministros das Finanças em Belém Cavaco Silva mostra que aprendeu qualquer coisa com Mário Soares. Este último também tomava iniciativas que fragilizavam o Governo e o primeiro-ministro, então Cavaco Silva, que se queixava das forças de bloqueio. Hoje, o mesmo Cavaco, agora Presidente, utiliza semelhante expediente, ainda que sem a exuberância soarista. Não é esse o seu estilo, mas o objectivo é o mesmo.

Isto comprova que o azedume entre Belém e S. Bento se mantém e agravou. E que, mesmo em altura de crise profunda, quando o País parece uma jangada de pedra, ainda se opta pelo desnorte, quando se exigia responsabilidade, concertação e sentido de Estado.

Sentido de oportunidade

O Prof. Adelino Maltês dizia, no outro dia, na SIC Notícias, que esta semana ia ser uma parvoíce: o Benfica campeão, o Papa anda por aí.

A escolha do Governo, pela voz de Teixeira do Santos – e não pela de José Sócrates – para anunciar a necessidade de subir impostos, eventualmente sobre os salários, para cumprir compromissos assumidos em Bruxelas, recaiu sobre esta segunda-feira, quando o País boceja às secretárias e se encontra ressacado da noitada de ontem. Amanhã chega o Papa.

No Natal, quando olharmos para os nossos recibos de vencimento (quem a eles tiver direito), existirão surpresas.

07/05/2010

Isto é que é insultuoso

Esta história não é insólita. É um insulto a todos nós. Ao País. Um homem que foi eleito, que é deputado, ainda que canalha, deve ter o pudor de parecer um homem de bem em público, caso contrário está a passar, a quem um elegeu, um atestado de estupidez. Foi isto que este sujeito fez.

Mas é certo que é inábil e, acima de tudo, burro. Porque este sujeito deve ter pensado que a coisa se ficava assim. E é tanto mais curioso quando, na entrevista, disse que os agravos de Sócrates com a imprensa só prejudicavam o primeiro. Palhaço.

Ora bem, este sujeito não conhece o mundo, aliás, como a maioria dos políticos que se abstraem nos corredores dos palácios e julgam que toda a gente joga aquele jogo da punhalada silenciosa.

Um político quando aceita ser entrevistado deve estar consciente e tranquilo em relação ao que lhe pode ser perguntado. Ou não responde. Mas escusa, como este sujeito, de se tentar armar ao pingarelho. E fazer um disparate destes.

Mais triste é que existe uma cambada de encarneirados (os socialista em geral) que se solidarizaram com este sujeito. Quando, se ele fosse um homem vertical, só teria uma alternativa: admitir o erro, um acto irreflectido ou um devaneio de infantilidade, demitir-se e desaparecer, envergonhado para todo o sempre, da cena pública.