27/11/2010

Não há aviões em Beja

O Tribunal de Contas revela que o Aeroporto de Beja é um flop ainda antes de ser realmente um aeroporto. O que é de estranhar é que o TC estranhe que isto aconteça.

O Aeroporto de Beja, sendo a reconversão legítima de uma infra-estrutura que ficaria ao abandono, na realidade não tem absolutamente nenhuma utilidade e resultou do espírito expansionista dos pequenos regionalistas (que por sua vez imitam o Estado), que na sua tacanhez saloia acreditam que o futuro do Alentejo se encontra, exclusivamente, no turismo (que aparecerá em massa, numa enchente desenfreada), que podemos competir com Espanha e que a existência de infra-estruturas é o motor do desenvolvimento. Tanto não competimos com Espanha, que na agricultura alentejana eles nos ludibriam todos os dias, alugando propriedades apenas para usar as quotas de produção, ou seja, nem as cultivam.

Vamos por partes: existe um aeroporto em Faro, o Aeroporto da Ota passou para Alcochete e tanto Faro como Alcochete não são distantes de Beja (à escala aeroportuária). A juntar ao facto de que Beja tem más acessibilidades e uma fraquíssima rede de transportes: a A2 fica a uns bons quilómetros, o comboio é pré-histórico e de conexões fracas e o transporte colectivo rodoviário é mau e é uma opção pouco frequente para quem chega de avião. O número de turistas que virão para Alqueva não justifica um aeroporto e o Litoral Alentejano tem muito melhores acessibilidade a Alcochete ou Lisboa que a Beja.

Depois juntou-se o patético argumento da imprescindibilidade do aeroporto de Beja para o desenvolvimento do porto de Sines. Juntou-se a martelo, porque os arautos regionais estão convencidos que Beja esgotará a capacidade em voos turísticos. O transporte de mercadorias por avião só se efectua em último recurso, é caro e apenas pode crescer se o preço dos combustíveis baixar drasticamente. Por outro lado, as mercadorias de Sines têm de chegar à plataforma logística do Poceirão, pelo que ir a Beja só para justificar o aeroporto será um erro tremendo, com impactos sérios nos custos das obras da ferrovia. A juntar a isto há um imperativo: o porto de Sines só é competitivo se as mercadorias chegaram a Madrid em menos de 9 horas, o que só é possível de comboio e por uma linha a mais directa possível, passando no Poceirão, onde se encontra a plataforma logística.

Existem vários planos de ordenamento e de estratégia, europeus, ibéricos e nacionais onde esta ligação Sines-Madrid, por ferrovia, está contemplada, sendo o avião sempre subsidiário dessa opção. Também aqui o regionalismo bacoco tem desempenhado um papel importante, sendo, inclusivamente, responsável pelo congelamento, em 2009, do arranque o projecto ferroviário Sines-Madrid, que os autarcas e o Governo aprovaram no Plano Regional de Ordenamento do Território, mas que veio a ser contestando por argumentos de ordem municipal, em grave prejuízo do interesse nacional. O porto de Sines tem três significados: exportação, emprego (numa região deprimida), crescimento económico (regional e nacional). Para que isso se cumpra estão documentadas, técnica e politicamente, as necessidades. Adiar é adiar a competitividade. Ainda o ano passado, uma fábrica de automóveis declinou a instalação em Sines dada a ausência da linha ferroviária para Madrid. Menos investimento, menos exportações, menos emprego. E a movimentação de carga contentorizada tem um crescimento limitado à escala da capacidade de escoamento de Sines.

O aeroporto de Beja é a prova de que temos uma tendência expansionista que tem vindo a comprometer o futuro do País. Beja não passaria a ser um mega centro de negócios só porque tem um aeroporto. Não choveriam empresas ansiosas por estar pertinho dos aviões. O aeroporto é que poderia vir dar resposta a essas realidades, caso estas revelassem crescimento sustentado.

E isto é a prova de que a regionalização pode ser catastrófica em Portugal. Os interesses individuais, a ilusão e irresponsabilidade das lideranças políticas arrastam o Pais para uma situação extrema. Multiplicar as más lideranças é o mesmo que multiplicar aeroportos pelo número de regiões, de distritos e se nos descuidamos de concelhos.

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